Quando me apresentam decisões precipitadas, apressadas, impensadas, irresponsáveis, tenho por hábito dizer que é melhor fazer como indicam os sinais das passagens de caminho de ferro: “Pare, Escute, Olhe”. Reflectir para só depois agir. É esse o conselho de Jorge Pelicano num documentário militante que alerta para a morte anunciada da linha férrea do Tua, em risco de ficar submersa devido à construção de uma barragem.
Este jovem realizador, repórter de imagem da SIC, cujo primeiro filme “Ainda há pastores” foi bastante premiado, conseguiu desta vez vencer o prémio do Melhor Documentário Português no DocLisboa 2009 entre outras distinções. Nesse festival, aquando da sua estreia, foi alvo de algumas críticas, nomeadamente por quem o considerou uma reportagem de televisão. Mas este filme – porque é um filme documentário – é um manifesto político em defesa de um património e de uma gente. Para tal não tem pudor (felizmente!) de mostrar os políticos, as suas contradições e de lhes apontar o dedo. Porque estes, movidos pela ganância, estão dispostos a destruir irresponsavelmente uma “identidade”, como afirma a determinada altura um professor universitário espanhol.
Há nesta obra o retrato de uma região esquecida, de um interior deixado para trás. Parte de um país onde a população idosa vê emigrar os mais jovens e verá a sua agricultura submergida pelas águas da barragem. Portugueses que vêem desaparecer o seu povo e a sua terra. Tudo em nome do “progresso”, esse perigoso mito arrasador e uniformizador, cujos efeitos nefastos são muitas vezes irreversíveis.
Que este excelente filme seja um despertar. Que gere uma mobilização, não só pelo Tua, mas por Portugal. Para que, perante as mentiras dos (des)governantes, ou o desejo de cimento afirmado pelo primeiro-ministro José Sócrates no estaleiro de construção da barragem, digamos não! E estejamos dispostos a contrariar a voracidade do lucro e o primado da economia, recordando que são as pessoas e suas vidas que formam uma nação.
São exactamente essas pessoas a quem é dada voz neste trabalho, que tem como tela uma das paisagens mais belas do nosso país. As suas reivindicações provocam tanto a revolta e a indignação, como a melancolia e por vezes até um sorriso.
“Pare, Escute, Olhe” é também um livro, um blogue, um sítio na internet (http://www.pareescuteolhe.com/), um movimento de intervenção cívica. É uma postura diferente do habitual conformismo português.
Paremos para ver este filme. Paremos para depois agir. Paremos para salvar uma identidade. Paremos... [publicado na secção CineMais da edição desta semana de «O Diabo»]
PARE, ESCUTE, OLHE
Realização: Jorge Pelicano
Portugal, 2010, 102 min.
Estreia em Portugal: 8 de Abril de 2010
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Um desafio, faz uma recomendação de 10 longa-metragens Portuguesas que todos os Portugueses deviam ver.
ResponderEliminar(podem ser mais de 10, ou por temas...)