Noites no MOTELx

Cinema São Jorge
Decorreu entre 7 e 11 de Setembro, no cinema São Jorge, o MOTELx - Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa, um evento que com apenas quatro anos de existência se tornou uma referência. O público interessado, sempre participativo e interventivo, proporcionou um óptimo ambiente. Uma das coisas que me agrada é ver um dos cinemas emblemáticos da capital cheio de gente, maioritariamente jovem. A propósito do crescimento deste festival, perguntei a Pedro Souto, um dos directores (ver entrevista abaixo), se havia a ideia de o alargar a outros cinemas. Ele foi categórico e disse-me que a casa do MOTELx é o São Jorge.

Noite Sangrenta (*)
Estava curioso em relação a “Noite Sangrenta", a mini-série em dois episódios da RTP, que retrata a noite brutal da "camioneta fantasma" e que abriu o MOTELx em antestreia nacional. Está bem filmada e produzida, notando-se algum cuidado na recriação da época, tanto nos cenários, como no guarda-roupa. Já no registo oral, desiludiu. Por exemplo, soa logo mal o sotaque lisboeta actual de uma criada ou de um guarda prisional de Coimbra, no início do século XX. Estes pormenores prendem-se, a meu ver, com uma falha em reproduzir (ou reconhecer?) a marcada divisão de classes de então. Mas o pior, como alguns me avisaram, é mesmo a inspiração ideológica desta obra. Apesar de se anunciar como obra de ficção, propõe uma versão da tenebrosa "noite sangrenta" na qual os responsáveis são meros idiotas úteis de uma conspiração "das direitas"... É mais uma celebração de uma República imaginária — um mero acto de propaganda.

Survival of the Dead (***)
George A. Romero e Nuno Markl
George A. Romero é um nome que associamos automaticamente a ‘zombies’ e foi o convidado de honra desta edição do festival. Ao apresentar o seu último filme deste tema, notou-se que sentia o carinho do público e mostrou-se muito contente por estar em Portugal. Lembrou que filmes deste tipo são para ser divertidos e que esperava que dessem umas boas gargalhadas e passassem um bom bocado. “Survival of the Dead” é desenvolvido a partir de uma personagem secundária de “Diary of the Dead” (2007) e há uma questão pertinente a colocar: é possível inovar? A resposta é positiva, ou não estivéssemos a falar do “mestre dos mortos-vivos”. Posso adiantar que, apesar de tudo aquilo que esperamos de um filme deste tipo, há uma evolução nos ‘zombies’, que como reconheceu o realizador, deve abrir portas a uma continuação. No último dia, Romero respondeu a perguntas do público, numa sessão moderada por Nuno Markl.

F (****)
Esta foi uma óptima surpresa neste festival, um belo regresso ao medo nos filmes de terror, como disse Johannes Roberts numa vídeo-mensagem antes da projecção de “F”. Este realizador britânico, que à última hora não pode estar presente no MOTELx, não deixou ainda de saudar os espectadores e dizer que este trabalho era uma “carta de amor” a Carpenter e o seu clássico “Assalto à 13.ª Esquadra” (1976). Realmente, o ambiente claustrofóbico da escola que é atacada por jovens encapuzados, cujo único objectivo é assassinar brutalmente quem encontram, é essencial para a tensão permanente que se sente do início ao fim. Mas a história não se resume ao terror. Explora muito bem o campo das relações humanas, sejam no registo politicamente incorrecto em que é tratada a relação aluno-professor, seja na complicada relação pai-filha. A não perder.

Centurion (***)
Mais um realizador britânico que não pode estar presente, mas que em vídeo deu alguns pormenores interessantes sobre a realização de “Centurion”, rodado em seis semanas nas ilhas escocesas em temperaturas negativas e condições adversas. Esse realismo transparece para o filme e é bom. No entanto, apesar das magníficas paisagens serem irresistíveis, Neil Marshall abusa dos planos aéreos. Apesar de certas personagens e algumas opções da história não serem as melhores, esta é uma boa incursão no mundo guerreiro da Antiguidade.

Sala cheia
Curta vencedora e The Revenant (*)
No último dia, foi entregue o prémio MOTELx para a Melhor Curta de Terror Portuguesa 2010 a “Bats in the Belfry” (Portugal, 2010, 8') de João Alves, atribuído pelo júri constituído por Alan Jones, José de Matos-Cruz e José Nascimento. De seguida, foi projectado “The Revenant” (2009), de D. Kerry Prior, um daqueles penosos exercícios que são as tentativas de humor sem graça. Apesar das gargalhadas de parte do público, não me arrancou um sorriso e foi uma estopada que, para mim, fechou mal um óptimo festival. Para o ano, felizmente, há mais. [publicado na secção CineMais da edição desta semana de «O Diabo»]

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